quarta-feira, 6 de março de 2013

Amor


Amo-te a ti mas não a esse monstro em ti

A nossa visão compartimenta.
Aquele é ele, e ele tem um lado solar e outro lunar. E eu gosto dele quando está bem, mas acho-o estúpido e dá-me raiva quando está mal.
É uma espécie de possessão. Uma espécie de vírus que se instala, uma espécie de montruosidade, um parasita que se apodera de quem amamos criando aspectos hediondos na vítima dando-nos tanto a lamentar. Tanta potencialidade deitada ao lixo. Uma pena...
Viver só é ser bocados.
Aqui posso ser assim, ali posso ser assado.
Todos nós experimentamos um pouco dessa solidão, todos percebemos que não podemos ser o mesmo em todas as circunstâncias.
Para os adictos isso ganha proporções apocalípticas. Sempre que alguém diz: Gosto tanto de ti mas não gosto de isto em ti. Esta frase é como um serrote.
Do ponto de vista do adicto, tudo é inteiro. Eu sou esse. Eu não consigo ser este e aquele, por isso estou perdido. Estou desgraçado. Sei como neutralizar isso. Só preciso de aumentar o desvario e isto vai desaparecer.
Do ponto de vista do co-dependente, o adicto é um doente, enquanto o co-dependente é a vítima.
Do ponto de vista da comunidade em geral o adicto é-o consoante o objecto da adicção. Ser um acumulador compulsivo, um jogador compulsivo, um comedor compulsivo, um adicto aos jogos de computador, da televisão, de adrenalina, de sexo... são adicções repulsivas mas não criminosas nem socialmente reprováveis. São apenas faltas de personalidade.
Lá está. Falta de personalidade. Lá estão pessoas cortadas às fatias.
Só existe uma forma de amar sem deixar o outro sozinho: Amando o sol e a lua, dando respeito, verdade, dizendo sim e não de forma objectiva, não participando do jogo de sombras, participando do pedido de ajuda sincero. O todo do outro não é feito de bocados. Não dá para separar gosto disto mas não respeito aquilo.
Cada um é um todo em si mesmo.
Quem ama percebe isso, não se auto-vitimiza, nem faz teatrinhos.
Perde o medo e abraça tudo, ou vai embora e deixa o adicto em "paz".


O que é, e não é amor

Talvez não exista assunto mais importante na vida das pessoas.
Talvez não exista um assunto mais mal arrumado e mal crescido do que este.
É difícil definir o que é o amor, para saber se o vivemos, se o sabemos viver.
No entanto é mais claro e fácil de compreender o que não é amor, para irmos por exclusão de partes.
É essa exclusão, e essa capacidade de manter critérios, que facilmente se perde dentro da necessidade que todos temos de amar e ser amados e que, rapidamente, se transforma em carência a qual provoca comportamentos compulsivos, os quais deixam de ter seja o que for a ver com amor.
Tenho-me apercebido de que muitas pessoas só compreendem o amor que perdem, outras aprendem a amar no limite com um sentimento de “tarde de mais”.
Demasiado tarde nos apercebemos muitas vezes do quanto somos mesquinhos no amor, do quanto desvalorizamos as subtilezas do amor, valorizando antes os conflitos do ego, a necessidade de ter razão, a necessidade de controlar e de impor ritmos, regras e circunstâncias.
Por outro lado, demasiadas vezes chamamos amor a coisas que não são amor, confundindo a nossa necessidade vital e humana de amar e ser amado, com o “precisar” daquela pessoa específica ou achar que a outra pessoa “precisa” de nós.
Precisamos de amor, mas não de ter ou ser tido, de ficar preso, de ser “daquele alguém“.
Precisamos do sentimento de amar, porque nos abre a dimensões de expansão e liberdade e nunca por nos prender a rotinas, a esquemas, a manipulações e a carências.
Na realidade amar em última análise pode ser muito simples.
Começa por amor próprio.
Não podemos dizer que amamos outros se não nos amamos a nós mesmos. E não podemos amar-nos a nós mesmos se não nos garantimos espaço para a felicidade e para a liberdade de sermos quem somos e de termos a noção do sagrado da nossa natureza.
Ao aprendermos a amar-nos dessa maneira, estamos aptos a passar à fase B, que é amar outros dentro do pressuposto, de amar os outros como a nós mesmos, ou seja, dando-lhes o espaço e a liberdade de serem exactamente como são.
Podemos estar juntos ou separados. Mas só podemos viver uns para os outros quando aquilo que somos fica inteiro, não se parte, nem divide, nem se deforma para se moldar a situações, a prisões, a seja o que for que desrespeite a nossa natureza, a nossa verdade, o facto de que nascemos um, e morremos um, porque somos Um, e não dois.
Não somos os filhos, não somos os pais, não somos o namorado, a namorada, o noivo, o marido, a mulher, a mãe, não somos tanta gente. Somos simplesmente um indivíduo, que precisa de crescer e de ser amado nisso, por si mesmo e por outros.
Se amar e ser amado é uma necessidade básica, crescer e ser é ainda mais importante. Por isso há que manter as coisas em perspectiva e aprender a dar aquilo de que se precisa realmente.
A próxima vez que achar que ama alguém, pense se será mesmo amor. E se não for, comece pelo amor próprio, o primeiro e último de todos os amores.


Amor e ser pessoa

Desde que nascemos que fundamentalmente, precisamos de amor. Para sobreviver precisamos de alimento e de alguns outros elementos puramente orgânicos, mas para sermos pessoas, precisamos de amor mais ainda do que de alimento.
Essa forma de amor que aprendemos dos nossos primeiros meses e anos, desde a gravidez à entrada para a escola, molda a forma como iremos amar e ser amados por toda a vida, excepto se alterarmos esse padrão, com bastante tenacidade e persistência, uma vez conscientes deste processo.
Para muitos pais é óbvio que amam os seus filhos. Dirão mesmo que os amam acima deles mesmos, mais do que as suas próprias vidas. No entanto ninguém pode dar o que não recebeu, nem pode saber o que nunca aprendeu, e se não fomos amados com um amor abnegado, saudável, e feliz, simplesmente não temos isso para dar.
São já numerosos os estudos que nos demonstram que o amor dito incondicional é simplesmente uma pérola, uma raridade.
Podemos dizer que a esmagadora maioria das crianças nasce e cresce em formas de amor imaturas, com pessoas que estão muitas vezes nos primeiros passos da maturidade emocional, por mais bem sucedidas que possam parecer noutros aspectos.
Amor limpo e amor livre, é um amor que expande e liberta, que dá espaço, que valoriza o que existe, que não passa mensagens mais ou menos sublineares de que não somos suficientemente bons, ou de que precisamos de nos esforçar para merecer demonstrações de amor.
Amor incondicional, é um amor que deixa ser cada um como é, e apenas promove ferramentas de potenciação da natureza sagrada de cada um.
A esmagadora maioria das crianças não terá isso.
Nenhum adulto é adulto sem ter sido essa criança que não teve esse amor incondicional.
A maioria das pessoas cresceu, cresce e crescerá com um défice de demonstrações de afecto gratuitas, com valorização incondicional e com investimento amoroso e entusiasta sobre as suas características e pequenas grandes conquistas enquanto atravessa o nascimento e os seus primeiros anos de vida.
Com a ideia de que educar é moldar, retirar comportamentos indesejáveis e premiar comportamentos desejáveis, damos boas razões às crianças para decidirem que têm aspectos errados, que estão como que avariados e que precisam de arranjar máscaras que façam parecer que se adequaram.
Adultos são conjuntos sofisticados de máscaras que caiem em situações limite, mas que servem no dia a dia para tornar a vida suportável.
No entanto o ser autêntico não morre. Fica ali transformado em sombra e aparece aqui a ali nas nossas iras, compulsões, e comportamentos inexplicáveis.
Ser pessoa é já estar completo. Como dizia a frase tão bonita: Os teus filhos, não são teus, são filhos da vida.
Quem de nós aprendeu que era filho da vida, e que já era completo e uma obra sagrada da vida, e que era amado incondicionalmente?
Quem de nós aprendeu que amar é gostar de ver o outro ser livre?
Quem de nós aprendeu que amar é dar ao outro a liberdade de ser exactamente quem é, como é?
Quem de nós foi ou é amado assim?
Amor e sofrimento, são a aliança da cultura romântica na qual gerações crescem a acreditar que amor é sacrifício, que amor é sofrer, que amar o outro pode alguma vez ser incompatível com amor próprio.
Na realidade amar sem amor próprio, é amar sem se ser completamente pessoa plena, autêntica, viva e cheia de generosidade. Ter para dar, implica receber para ter.
Quando damos, damos, damos... sempre na mesma direcção, sem o retorno da gratidão, do amor mútuo, do espaço e da liberdade que como ser precisamos para viver,não é amor, é doença.
A doença de que mais se padece por essas casas todas, famílias, cidades, janelas de prédios.
Amar e ser pessoa, são aprendizagens do berço ao bacio. É nessa altura que se aprende o que é ser respeitado, ser amado com calma, com abertura e alegria.
Quem não teve isto, e quase ninguém teve, precisa de re-aprender. E isso não é vergonha, é esperança. Esperança de que afinal há outra forma.
Aliás esta forma de viver, nunca o foi.




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