sábado, 1 de junho de 2013

Diferenças reais, são diferenças imaginárias?


O álcool é a substância cujo uso é estimulado pelo mercado e pelo costume geral e tem penetração livre em todos ambientes sociais, enquanto a droga apresenta um uso às escuras, escondido em ambientes públicos e reservado em ambientes privados, não apresentando a mesma popularidade do álcool.

O álcool não produz violência no que tange à sua estrutura de produção e circulação, porque está integrado ao sistema econômico legal, associando a si, apenas os eventuais comportamentos agressivos de indivíduos intoxicados. Já as drogas ilícitas se relacionam diretamente com a produção de violência, uma vez que toda sua estrutura de produção e distribuição é marginal e se mantém pelo embate contra as forças institucionais. Além disso, um usuário de drogas ilícitas, sabendo-se agente de um crime, apresenta tendência de buscar escapar de eventuais situações em que seja flagrado na atividade de uso ou de porte da substância, o que pode (não necessariamente) dar margem a algum evento violento neste processo.

É razoável supor que o impulso para o uso do álcool esteja mais ligado aos padrões de identificação com a norma enquanto o impulso para uso de drogas ilícitas esteja mais ligado a identificação com a transgressão, mesmo não se constituindo isso uma regra imperativa.

O número de usuários e dependentes de álcool no Brasil (11,2% da população é dependente) é muitas vezes maior que a soma do número de usuários e dependentes de todos os outros tipos de substâncias psicoativas (3,3% da pop. é dependente de outras drogas), e boa parte dessa diferença é justificada pelo acesso permitido, fácil e altamente estimulado ao álcool e pelo acesso proibido, difícil e perigoso às drogas ilícitas.

São diferenças imaginárias, pensar que:

·O álcool é mais "leve" que outras drogas e por isso é legalizado
·Do álcool, pode-se fazer um uso eventual enquanto qualquer uso de outras drogas é entendido como problemático (enquanto o uso de 1 a 2 drinks por semana é entendido como risco grave por 26,7% da pop., 43,2% da pop. acredita que 1 uso de maconha na vida - 1 experiência, portanto - é um risco grave para o sujeito
.Qualquer usuário de drogas é visto como um sujeito perigoso, afetado ou doente, enquanto os usuários de álcool são pessoas "normais"
·O uso de uma droga leva ao uso de outra, sendo o álcool excluído desta lógica
·O álcool é associado à boa vida, relaxamento, amizade e sexo e as drogas à miséria, doença, sofrimento e loucura.

Cada mito desses é permanentemente desmentido pela observação dos fatos.

A legalidade do uso de álcool não pode ser associada ao menor malefício de suas propriedades porque isso não é verdadeiro. O álcool não é mais "leve" que outras drogas. É absolutamente arbitrário seu estatuto legal no Brasil como em qualquer outro lugar do mundo (inversamente, também é arbitrária a proibição do álcool no mundo islâmico, onde o uso do haxixe é amplamente tolerado).

Não existem pontos únicos, fixos e pré-determinados que estabeleçam tipos de usos para nenhuma substância psicoativa, seja álcool ou qualquer outra. Existe um continum entre o uso do experimentador e o uso do dependente e os critérios para a definição do tipo de uso são multifatoriais e são os mesmos para qualquer substância.

A categoria geral "usuário de drogas ilícitas" não torna esses sujeitos mais perigosos, afetados ou doentes que os usuários de álcool. As variações se dão na particularidade de cada caso, pela influência de muitos outros elementos componentes do quadro.

É muito raro um indivíduo provar uma droga ilícita sem antes não ter experimentado o álcool ou fazer dele um uso regular. O álcool é então a substância que mais antecede o uso de outras. É inegável, no entanto, que a ilegalidade de outras substâncias, obstaculariza, cria uma resistência ao seu uso. Quando um indivíduo ultrapassa esta barreira e passa a usar uma droga ilícita, sua resistência a experimentar uma outra droga ilícita será, provavelmente, menor.

Qualquer substância psicoativa é uma eventual fonte de prazer e problemas. Não existem diferenças entre o álcool e as drogas ilícitas quanto a isso (quando se desconsidera os eventuais problemas legais que o uso de drogas ilícitas pode acarretar).

Pois bem, essa é a importância das informações extraídas da observação objetiva. Podemos ver as coisas da forma como elas realmente se apresentam e a partir daí orientar os nossos passos de maneira eficaz.

O que vimos até agora foi que a diferença que justifica a separação entre álcool e drogas é meramente jurídica, não se apoiando em nenhum outro suporte de sustentação. Mas será que o estatuto legal é a melhor forma de classificarmos as diferentes substâncias psicoativas? Será que, como vimos, esta classificação entre lícito e ilícito não acaba por gerar mais compreensões equivocadas e imprecisas? Não será essa divisão promotora de uma neblina que esconde, entre outras coisas, o problema do uso do cigarro e das drogas medicamentosas?

Ao nosso ver, de fato, embora não deva ser desconsiderada, a classificação jurídica não ajuda muito na compreensão sobre as substâncias psicoativas e sobre os problemas que estão eventualmente associados a seu uso. Isso porque essa classificação deconsidera a existência de um nível de redutibilidade que iguala todas as substâncias psicotrópicas, por serem todas definidas por uma fórmula comum.

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